domingo, 12 de setembro de 2010

As Eleições e os Políticos!


Por; Solano Portela

Como estamos na proximidade das eleições de 2010, resolvi "requentar" este post antigo, que ajuda também a responder algumas perguntas que me têm sido feitas por e-mail. No final do texto, apresento comentários que podem auxiliar os cristãos na hora do seu voto consciente - Solano


O Caráter do Político Astuto: Um Estudo sobre a Vida de Absalão

2 Samuel, capítulos 13 a 18
Introdução
A história de Absalão não é uma história bonita. Filho do Rei Davi, ele teve uma existência
marcada por inúmeros pecados. Era uma pessoa atraente, simpática, e famosa, que realmente chamava a atenção. Poucas pessoas no mundo poderiam receber o tipo de descrição que dele é feita em 2 Sm 14.25: “Não havia, porém, em todo o Israel homem tão celebrado por sua beleza como Absalão; da planta do pé ao alto da cabeça, não havia nele defeito algum”. Quando lemos a sua história, registrada nos capítulos 13 a 18 de 2 Samuel, vemos que ele era um daqueles “líderes natos”, com personalidade marcante e carismática. Era impulsivo em algumas ações, mas igualmente maquinador e conspirador para preencher suas ambições de poder. Por trás de um passado que abrigava até um assassinato de seu irmão, ele não hesitou em utilizar e manipular pessoas e voltar-se contra seu próprio pai, para vir a governar Israel. Uma vez no poder, demonstrou mais impiedade, crueldade e imoralidade. No seu devido tempo, foi castigado por Deus, sofrendo uma morte inglória, sendo Davi reconduzido ao poder.

O caráter de Absalão não é diferente de muitos personagens contemporâneos de nossa política. Na realidade, ele reflete bem como a ambição pelo poder, conjugada com outros pecados, transtorna o comportamento de políticos “espertos” e “astutos”, levando-os a uma vida de engano e egoísmo desenfreado, na maioria das vezes com o aproveitamento pessoal do bem público. Nessa época de eleições e mesmo após elas, necessitamos de sabedoria e discernimento, para penetrarmos a couraça de fingimento que é mostrada à sociedade. Necessitamos de uma conscientização de nossas responsabilidades, como cidadãos, para que estejamos cobrando, com o devido respeito, as responsabilidades de nossos governantes, conforme estipuladas nas Escrituras em Romanos 13.

Nosso propósito, neste post, é estudar as ações de Absalão registradas no capítulo 15 de 2 Samuel, versos 1 a 12, identificando algumas peculiaridades de sua pessoa e caráter para que sirva de alerta à nossa percepção do mundo político e da busca pelo poder. Acreditamos que essas características são reflexos da natureza humana submersa em pecado. Devemos aprender, portanto, que devemos resguardar nosso apoio irrestrito, a tais pessoas de intensa ambição. Devemos também agir responsavelmente como cidadãos cristãos, na medida do possível, para que as instituições que tais pessoas pretendem governar sejam também resguardadas.


As Características de Absalão

Vejamos, 10 características do político astuto e matreiro que foi Absalão, conforme o relato que temos no capítulo 15 do Segundo livro de Samuel:

1. Ostentação e demonstração de poder. No verso 1, lemos: “Depois disto, Absalão fez aparelhar para si um carro e cavalos e cinqüenta homens que corressem adiante dele”. No capítulos 13 e 14 lemos como Absalão ficou foragido, após assassinar seu irmão. Aparentemente, Davi tinha grande amor por Absalão e, após três anos dos acontecimentos que culminaram no assassinato e fuga, Davi o recebe de volta. Absalão era famoso. Em 2 Sm 14.25 lemos que ele era “celebrado” por suas qualidades físicas invejáveis e impecáveis. Possivelmente tudo isso havia “subido à cabeça”. Em vez de assumir uma postura de humildade e contrição, em seu retorno, o texto nos diz que ele trafegava em uma carruagem com cavalos. Semelhantemente a tantos políticos contemporâneos ele se deleitava na ostentação e na demonstração de poder. Nesse sentido, formou um extraordinário séquito de “batedores” – cinqüenta homens que corriam “adiante dele”. Certamente tudo isso contribuía para chamar ainda mais atenção, para a sua pessoa, e ia se encaixando nos planos que possuía, para a tomada do poder. Vamos ter cuidado com aqueles que buscam a ostentação e a demonstração do poder que já possuem, pois irão aspirar sempre mais e mais, às custas de nossa liberdade.

2. Comunicação convincente. O verso 2, diz: “Levantando-se Absalão pela manhã, parava à entrada da porta; e a todo homem que tinha alguma demanda para vir ao rei a juízo, o chamava Absalão a si e lhe dizia: De que cidade és tu? Ele respondia: De tal tribo de Israel é teu servo...”. Parece que Absalão não era preguiçoso. Levantava-se cedo e já estava na entrada da cidade, falando com as pessoas. Possivelmente tinha facilidade de comunicação, de “puxar conversa”. Identificava aqueles que tinham necessidades, aqueles que procuravam acertar alguma disputa e logo entrava em conversação com eles. Certamente essa é uma das características que nunca falta aos que aspiram o poder. Devemos olhar além da forma – devemos atentar para o conteúdo e a substância, procurando discernir os motivos do comunicador.

3. Mentira. O verso 3 mostra que Absalão era mentiroso. Era isso que Absalão comunicava àqueles com os quais ele conversava, com os que tinham demandas judiciais a serem resolvidas: “Então, Absalão lhe dizia: Olha, a tua causa é boa e reta, porém não tens quem te ouça da parte do rei”. Descaradamente ele minava a atuação, autoridade e função do rei Davi, seu pai. Com a “cara mais limpa”, como muitos políticos com os quais convivemos, passava uma falsidade como se fosse verdade. Certamente existia quem ouvisse as pessoas, em suas demandas. Certamente, nem toda causa era “boa e reta”, mas Absalão não estava preocupado com isso, nem com a verdade. Ele tinha os seus olhos postos em situação mais remota. Ele queria o poder a qualquer preço. Para isso não importava se ele tinha que atropelar até mesmo o seu pai. Não sejamos crédulos às afirmações inconseqüentes, às generalizações mentirosas de tantos que aspiram o poder.

4. Ambição e engano. O verso 4, confirma a linha de ação adotada por Absalão, na trilha da decepção: “Dizia mais Absalão: Ah! Quem me dera ser juiz na terra, para que viesse a mim todo homem que tivesse demanda ou questão, para que lhe fizesse justiça!” Será que realmente acreditamos que o malévolo Absalão estava mesmo preocupado com o julgamento reto das questões? Será que ele tinha verdadeira “sede e fome de justiça”? A afirmação demonstra, em primeiro lugar que a sua ambição era bem real – ele queria ser “juiz na terra” – posição maior que era ocupada pelo rei seu pai. Quanto à questão de “fazer justiça” – será que realmente podemos acreditar? Certamente com a demonstração de impiedade e injustiça que retratou posteriormente, quando ocupou o poder, mostra que isso era ledo engano aos incautos. Quantas pessoas terão sido iludidas por ele! Quantas o apoiaram porque acharam que ali estava a resposta a todas as suas preces e anseios – “finalmente, alguém para fazer justiça”! Como é fácil sermos iludidos e enganados em nossas necessidades! Não sejamos ingênuos para com promessas que não poderão ser cumpridas.

5. Bajulação. No verso 5, vemos como Absalão era mestre em adular aos que lhe interessavam: “Também, quando alguém se chegava para inclinar-se diante dele, ele estendia a mão, pegava-o e o beijava”. Que político charmoso! Estava prestes a receber um cumprimento, mas ele se antecipava! Com uma modéstia que era realmente falsa, como veríamos depois, ele fazia as honras para com o que chegava. Realmente era uma pessoa que sabia fazer com que os que o visitavam se sentissem importantes. Sempre gostamos de receber um elogio, de sermos bem tratados. Tenhamos a percepção de verificar quando existem interesses ocultos ou motivos noturnos por trás da cortesia aparente.

6. Furto de corações – O despertar de seguidores ferrenhos! O verso 6 fala literalmente dessa característica. Não, Absalão não violava sepulturas, nem estava interessado em transplantes de órgãos. Mas no sentido bem coloquial ele “roubava corações”: “Desta maneira fazia Absalão a todo o Israel que vinha ao rei para juízo e, assim, ele furtava o coração dos homens de Israel”. Com as ações descritas nos versos precedentes, Absalão angariava seguidores apaixonados por seu jeito de ser. Sua bandeira de justiça livre e abundante para todos, capturava o interesse, atenção e lealdade dos cidadãos de Israel. Não importava se havia um rei, legitimamente ungido pelo profeta de Deus. Aqui estava um pretendente ao poder que prometia coisas muito necessárias. Que era formoso de parecer. Que falava bem. O que mais poderiam as pessoas esperar de um governante? Será que alguém se preocupou em averiguar a sinceridade das palavras e das proposições? Será que alguém tentou aferir se as promessas proferidas eram possíveis de ser cumpridas? O alerta é para cada um de nós, também.

7. Falsa religiosidade – Os versos 7 a 9 registram: “Ao cabo de quatro anos, disse Absalão ao rei: Deixa-me ir a Hebrom cumprir o voto que fiz ao SENHOR, Porque, morando em Gesur, na Síria, fez o teu servo um voto, dizendo: Se o SENHOR me fizer tornar a Jerusalém, prestarei culto ao SENHOR”. É incrível como muitos políticos, mesmo desrespeitando os mais elementares princípios éticos, pretendem, em ocasiões oportunas, demonstrar religiosidade e devoção. No transcorrer do texto, vemos que tudo não passava de casuísmo, da parte de Absalão. Ele procurava costurar alianças. Procurava trafegar pela terra realizando os seus contatos, mas a fachada era a sua devoção religiosa. Pelo amor ao poder, antigos ateus declarados, se apresentaram como religiosos devotos. No campo evangélico deve haver uma grande conscientização de que existe uma significativa força eleitoral e política. Na busca pelo voto evangélico, muitos se declaram adoradores do Deus único e verdadeiro. Não nos prendamos às palavras, mas examinemos a vida e as obras de cada um, à luz das idéias que defendem. Vejamos também se as propostas apresentadas se abrigam ou contradizem os princípios da Palavra de Deus.

8. Conspiração – O verso 10, mostra que, finalmente, Absalão partiu para a conspiração aberta: “Enviou Absalão emissários secretos por todas as tribos de Israel, dizendo: Quando ouvirdes o som das trombetas, direis: Absalão é rei em Hebrom”. Insurgiu-se de vez contra o rei que havia sido ungido por Deus, para governar Israel. Não – ele não era um democrata que queria instalar uma república naquela terra. Valia-se de sua personalidade magnética, do seu poder de comunicação e das ações comentadas e registradas nos versos anteriores, para instalar um governo que seria não somente despótico, como opressor e abertamente imoral (2 Sm 16.22). Que Deus nos guarde dos políticos conspiradores, que desrespeitam as leis e autoridades e que são egoístas em sua essência.

9. Utilização de inocentes úteis – Leiamos o verso 11: “De Jerusalém foram com Absalão duzentos homens convidados, porém iam na sua simplicidade, porque nada sabiam daquele negócio”. Certamente essas duzentas pessoas, selecionadas a dedo, eram pessoas importantes e influentes. Certamente transmitiram a impressão que havia um apoio intenso e uniforme às pretensões de Absalão. Vemos que não é de hoje que as pessoas participam de uma causa sem a mínima noção de todas as implicações que se abrigam sob o apoio prestado. Devemos procurar pesquisar e estarmos informados sobre as causas públicas e sobre as questões que afetam a nossa vida e a da nossa nação. Nunca devemos permitir que sejamos utilizados como “inocente úteis” em qualquer causa, como foram aqueles “convidados” de Absalão.

10. Populismo – O verso 12 registra: “Também Absalão mandou vir Aitofel, o gilonita, do conselho de Davi, da sua cidade de Gilo; enquanto ele oferecia os seus sacrifícios, tornou-se poderosa a conspirata, e crescia em número o povo que tomava o partido de Absalão”. Vemos que, saindo do estágio secreto, a campanha ganhou as ruas e ganhou intensa popularidade, ao ponto em que um mensageiro chegou a dizer a David (v. 13) “o coração de todo Israel segue a Absalão”. Um dos ditos populares mais falsos é: “a voz do povo é a voz de Deus”. Não nos enganemos – muitas questões são intensamente populares, mas totalmente contrárias aos princípios da Palavra. Assim é também com as pessoas – a popularidade não é um selo de aprovação quanto ao comportamento ético e justo. Democracia (a regência pela maioria do povo) não é uma forma de se estabelecer o que é certo e o que é errado, mas uma maneira administrativa de se reger o governo sob princípios absolutos que não devem ser manipulados pela maioria, ou por minorias que se insurgem contra esses preceitos de justiça. Como cristãos, devemos ter uma visão muito clara dos princípios eternos de justiça, ética e propriedade revelados por Deus em Sua Palavra.


Conclusão

A história de Absalão que se iniciou no capítulo 13, continua até o capítulo 18. Absalão sempre gravitou próximo ao poder, mas aspirava o poder absoluto. Para isso, fez campanha, conspirou e lutou contra o seu próprio pai. Aparentemente esse político astuto foi bem sucedido. Foi alçado ao poder e lá se consolidou perseguindo e aniquilando os seus inimigos, entre os quais classificou o seu pai Davi, a quem tentou, igualmente, matar. Ocorre que os planos de Deus eram outros. Seu conturbado reinado foi de curta duração. Causou muita tristeza, operou muita injustiça e terminou seus dias enganchado pelos cabelos em uma árvore, enquanto fugia, e foi morto a flechadas.

Parece que vivemos permanentemente em campanha eleitoral, em nossa terra. A política, naturalmente, desperta fortes paixões, interesses e defesas. Muitos políticos, em sua busca pelo poder, passam a demonstrar muitas características demonstradas na vida de Absalão. É natural que alguém que almeja um cargo de liderança qualquer, possua um comprometimento intenso às suas idéias e objetivos. Os partidários, também submergem nesse mesmo espírito de luta. O problema vem quando a paixão, quer pelo líder, quer pelo poder, leva à cegueira moral, como na vida de Absalão. Nesse caso, desaparece a ética e princípios são atropelados. Os partidários, às vezes até sem perceberem, são sugados e manipulados. Em muitas ocasiões verificam que se encontram em uma posição de defender até o que não acreditam.

O cristão tem que se esforçar para ter uma consciência e vida tranqüila e serena perante Deus e perante os homens. Ele tem que se conscientizar que a sua lealdade é primordialmente para com Deus, para com a Sua Palavra objetiva, para com a causa do evangelho. Participação política consciente não significa lealdade inconseqüente. Na maioria das vezes o cristão verificará que se apoia esse ou aquele candidato, assim o faz não porque ele é o ideal e defensável em qualquer situação, mas porque representa o menor dos males, entre as escolhas que lhes são apresentadas. Sobretudo ele não pode se deixar manipular, como no caso dos seguidores de Absalão. Devemos, sempre, com respeito, apontar o desrespeito aos princípios encontrados nas Escrituras, por aqueles sobre os quais Deus colocou a responsabilidade de liderar o governo e as instituições de nosso país, lembrando 1 Tm 2.1-8, intercedendo sempre por eles em oração.
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Solano Portela


Extraido de:O tempora, O mores

Milagres


Por: Karl Heinz Kienitz

Somos um povo alegre e festeiro o ano todo, mas é por ocasião do Natal e da Páscoa, que a maioria das famílias brasileiras passa momentos especialmente agradáveis; é quando visitas de parentes e amigos, decoração especial e mesas fartas tornam palpável o aconchego festivo que se instala em nossos lares. O clima de festa de fato se justifica, pois, embora às vezes passe desapercebido, as duas datas existem para a comemoração de dois grandes feitos inusitados de Deus. No Natal comemoramos o nascimento de Jesus, no qual Deus “tornou-se homem e viveu aqui na Terra entre nós, cheio de amor e perdão, cheio de verdade”.1 Na Páscoa recordamos um evento absolutamente extraordinário, resumido por Simão Pedro em uma de suas célebres frases: “Deus ressuscitou este Jesus, e todos nós somos testemunhas disso”.2



Mesmo assim, para muitos o cristianismo é pedra de tropeço justamente por resultar de uma fé alicerçada em feitos inusitados de Deus, ou milagres, entre os quais os do Natal e da Páscoa são os mais significativos. Foram eventos marcantes – acontecimentos que selaram a fé cristã como única. O problema é que milagres parecem pertencer a uma visão de mundo estranha, pré-científica, supersticiosa, talvez adequada para a Antiguidade ou Idade Média, mas não para hoje.



Ceticismo com milagres já existiu na Antiguidade. Sua manifestação contemporânea, porém, tomou forma durante o Iluminismo. O filósofo David Hume (1711-1776), um dos primeiros mentores do ceticismo atual, dizia, referindo-se ao cristianismo, que “nossa mais santa religião é fundamentada na fé, não na razão”, completando em tom de deboche que “a religião cristã não somente foi inicialmente atendida com milagres, mas até este dia não pode ser crida por uma pessoa razoável sem um milagre. Simples razão é insuficiente para convencer-nos da sua veracidade; e quem é movido por fé para aceitá-la, está consciente de um milagre contínuo em sua própria pessoa, que subverte todos os princípios de seu entendimento, e dá-lhe uma determinação para crer o que é o mais contrário ao costume e à experiência”.3



Será que, como propalado por Hume e outros, a fé cristã depende de uma “subversão dos princípios do entendimento”? É esclarecedor ler o que o físico Alessandro Volta (1745-1827, homenageado no Volt, a unidade de tensão elétrica do Sistema Internacional de Unidades) tem a dizer sobre o assunto: "Submeti as verdades fundamentais da fé a um estudo minucioso. Li as obras dos apologetas e de seus adversários, avaliei as razões a favor e contra e assim obtive argumentos relevantes que tornam a religião [bíblica] tão digna de confiança ao espírito científico que uma alma com pensamentos nobres ainda não pervertida por pecado e paixão não pode senão abraçá-la e afeiçoar-se a ela".4



Como explicar esta enorme diferença entre as convicções de Hume e de Volta? C.S. Lewis (1898-1963), professor da Universidade de Cambridge e criador de “Narnia”, aponta o problema de Hume: “É claro que devemos concordar com Hume que, se ...[milagres] jamais aconteceram, então realmente nunca aconteceram. Infelizmente, só sabemos que a experiência contra eles é uniforme se conhecemos que todos os relatos sobre eles são falsos. E só podemos saber que todos os relatos são falsos se já sabemos que milagres jamais ocorreram. Na verdade estamos argumentando num círculo vicioso”.5



G. K. Chesterton, um dos mais prolíficos escritores ingleses do século 20, arremata: “Surgiu de algum modo a ideia extraordinária de que os descrentes de milagres os analisam com frieza e justiça, ao passo que os crentes em milagres os aceitam apenas em conexão como algum dogma. O fato é totalmente o contrário. Os que creem em milagres os aceitam (com ou sem razão) porque têm provas deles. Os que não creem neles os negam (com ou sem razão) porque têm uma doutrina contra eles... Somos nós, os cristãos, que aceitamos todas as provas reais – são vocês, os racionalistas, que refutam as provas reais e são obrigados a fazê-lo pelo seu credo”.6



O ceticismo debochado do filósofo Hume é, pois, insustentável. Cientistas cristãos como Volta, sabendo que milagres são eventos extraordinários com significância religiosa, operados por Deus e inacessíveis ao método científico, não têm problemas com eles, pois sabem que não é sua tarefa explicá-los; limitam-se a verificar evidências de sua ocorrência. Francis Collins, cientista chefe do Projeto Genoma Humano, confirma este entendimento: “Eu não tenho problemas com o conceito que milagres podem ocasionalmente ocorrer em momentos de grande significado, onde há uma mensagem sendo transmitida a nós por Deus onipotente. Mas como cientista adotei padrões muito elevados para milagres”.7



Por outro lado, um cristão algumas vezes se pergunta onde estão hoje todos aqueles milagres relatados na Bíblia e qual sua relevância para nós. Nessas ocasiões convém recordar como Asafe, o cantor, se dirigiu a Deus numa frase que expressa uma certeza experimentada e compartilhada por muitas outras pessoas: “Deus, eu lembrarei dos teus feitos maravilhosos! ...Tu és o Deus que faz milagres”.8



Quanto mais presente tivermos Deus como um Deus que opera também coisas inusitadas, mais confiantes estaremos ao enfrentarmos tempos difíceis. No outro extremo há cristãos pós-modernos que esperam de Deus uma solução para cada dificuldade por meio de milagres sob encomenda e medida. A Bíblia não induz a tal expectativa. Ela ensina que Deus cuida de nós e manifesta seu cuidado conosco até mesmo nas pequenas coisas do dia-a-dia, mas que seus pensamentos e ações estão muito acima dos nossos.9 Em resumo, no caminhar constante com Deus, o cristão reconhece de forma humilde e grata que tudo de bom provém de Deus e que ele é “socorro que não falta em tempos de aflição”.10 Pois fé cristã alicerça-se nos milagres de Deus, mas é fé em Deus; não é fé no poder de Deus, nem nos milagres de Deus.



Notas

1. O Livro, em João 1.14.

2. Nova Bíblia na Linguagem de Hoje, em Atos 2.32.

3. David Hume, Enquiry Concerning Human Understanding.

4. Traduzido de J. Gutzwiller, Das Herz etwas zu wagen, Friedrich Bahn Verlag, 2000. Também citado em K.A. Kneller, Christianity and the leaders of modern science, B. Herder, 1911 (disponível em books.google.com.br).

5. C.S. Lewis, Miracles.

6. G.K. Chesterton, Ortodoxia, 1a edição, Mundo Cristão, 2008.

7. Em entrevista à revista National Geographic, número de fevereiro de 2007.

8. Nova Bíblia na Linguagem de Hoje, em Salmo 77.11 e 14.

9. Pode-se ler sobre isto na Bíblia em 1. Pedro 5.7, Atos 14.17 e Isaías 55.7.

10. Nova Bíblia na Linguagem de Hoje, em Salmo 46.1.



• Karl Heinz Kienitz recebeu o doutorado em Engenharia Elétrica pela Escola Politécnica Federal de Zurique, Suíça. É professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica em São José dos Campos. Karl mantém uma página na internet sobre fé e ciência no endereço www.freewebs.com/kienitz

Metáforas de uma vida passiva




Por: Bráulia Ribeiro



Sentei-me na reunião de quinta com meu caderninho. Procurava comprovar uma preocupação que trouxera do Brasil. O campus de Kailua envia de trezentas a quinhentas pessoas em equipes missionárias de curto prazo para o mundo inteiro a cada trimestre. Jovens dirigem o louvor com solos de guitarra, pulos, vozes intimistas à moda Coldplay ou gritos primais em havaiano. Apesar do sabor internacional, da mistura de estilos, as letras não diferenciam das que cantávamos no Brasil na nossa igreja em Porto Velho. A maioria se refere às minhas emoções e a um Deus que me ama, salva, transforma, ampara, cura, trata, mima. Eu sou o centro de minhas adorações.



As palavras que usamos no dia-a-dia influenciam nosso comportamento. Palavras definem nossa relação com o universo e nossa expectativa pela vida. Se interpretamos de maneira mística ou meramente psicológica, o fato é que a linguagem tem uma função essencial em nossa existência.



No processo de nos fazer entendidos e tentar entender, criamos com as palavras figuras de linguagem. Usamos metáforas para compor imagens. Metáforas nos ajudam a criar padrões na linguagem, tecer realidades para explicar outras. Cada analogia nos leva a uma rede de referências. De acordo com James Geary, editor da coluna “Quotable Quotes”, da revista “Reader’s Digest”, e autor de um livro sobre metáforas, usamos seis metáforas por minuto, como um recurso corriqueiro na comunicação. Geary constatou por meio de um estudo que as metáforas influenciam nossas decisões.1 Pessoas se tornam mais propensas a uma decisão quando é estabelecido um determinado contexto, e metáforas criam o contexto das conversações.



No Brasil fiz uma análise textual de algumas músicas cristãs. Em quase todas o eu é soberano e central. Aqui procurei por metáforas. O que cantamos em nossos cultos, como nos vemos e como vemos ao Senhor? O que encontrei não me surpreendeu. O Senhor é doce, suave, meigo, uma brisa, um furacão, um abraço, um calor que me inunda, o abrigo que me protege, a mão que me ampara, um grande coração, aquele que me faz voar, aquele que chora por mim, que tem ciúmes de mim. Ele é também glória, majestade e beleza. É o Cordeiro com muito mais frequência do que é o Leão... Nenhum problema. O nosso Deus é mesmo tudo isto. Mas é também muito mais. Eu, por minha vez, sou frágil, estou abatido, magoado, ferido e cansado; sou um nada, preciso de proteção; estou sempre à beira do pecado, estou chorando, meu canto é um eterno lamento.



Vemos aqui um quadro triste no evangelicalismo atual. Embora verdadeiras, as imagens de um Deus extremamente meigo e dos seres humanos fragilizados, a quem ele serve, não nos contam toda a história. Produzem um estado mental angustiado e egocêntrico. Enquanto olho pra minha fragilidade, não ajudo o próximo. Enquanto fraco, nada vejo além do meu umbigo. Envolvido em meu romance celestial, esqueço meu destino terreal.



Nos anos 80, as músicas que produziram a minha geração missionária falavam de guerra, de exército, de conquista. Jesus era o Leão de Judá, o Senhor dos Exércitos, e eu, o soldado obediente à missão a qualquer preço. Pode-se argumentar que as metáforas daquela época produziram, quem sabe, o erro de uma missão arrogante, cega à realidade humana. As metáforas de hoje, no entanto, produzem uma passividade total. Enquanto canto àquele que me ama, sou uma árvore plantada no lugar de minha conveniência esperando que a brisa me refresque e o abrigo me proteja. Minha missão inexiste. Só nos resta esperar que James Geary esteja errado.



Nota

1. www.ted.com/talks/james_geary_metaphorically_speaking.html





• Bráulia Ribeiro trabalhou na Amazônia durante trinta anos. Hoje mora em Kailua-Kona, Havaí, com sua família e está envolvida em projetos internacionais de desenvolvimento na Ásia. É autora de Chamado Radical (Editora Ultimato). braulia.ribeiro@uol.com.br









sábado, 4 de setembro de 2010

Meias verdades


Por Kallil Souza





Analisar o mundo contemporâneo de uma forma reflexiva e critica não nos parece uma tarefa fácil, quanto mais em um mundo mais e mais globalizado aonde as informações nos chegam aos kilos a todo segundo.



Partimos de um principio de que a analise está sempre subordinada ao analisador. Como disse certa vez o escritor Leonardo Boff “Um ponto de vista é sempre a vista de um ponto”.



Nesse ponto, entramos uma questão interessante, de que alicerce refletimos sobre a vida? Qual o nosso ponto de partida para priorizarmos nossos conceitos e ideologias?



Todos gostamos de opinar sobre tudo e todos, chegando ao ponto de acharmos que todo aquele que discorda do nosso ponto de vista esta errado.



Temos motivos para pensar que muitos de nossos argumentos são condicionados por fatores que nos atingiram de alguma forma relacionado ao fato do qual falamos. Uma Criança não falará bem do cachorro “querido” do vizinho se este o morder, da mesma forma sempre temos um “mas” a falar de alguém que “pisou em nosso pé” (mesmo que seja uma excelente pessoa que apenas cometeu um deslize). Somos tão parciais e unilaterais, regidos por sentimentos e distorções da realidade que chegamos ao ponto de não sabermos os “rudimentos da doutrina de Cristo” (Hebreus 6:1).



Depois de tudo isso onde mesmo queremos chegar? Talvez soe pretensioso, mas queremos chegar aos alicerces do que é a verdade. O que ela é? De onde veio? Para que serve?



A verdade não pode ser relativizada e esfacelada em pequenos pedaços onde cada um escolhe a seu bel-prazer a parte que lhe interessa, não procede de dentro de cada um como pensam alguns filósofos da modernidade e nem é algo subjetivo como pensam outros.



Ela (a verdade) tem que ser transcendente e ao mesmo tempo concreta, uma estrada que nos leva a algum lugar e não á um labirinto que confunde. Tem que nos esclarecer as duvidas por ser o repudio a tudo que é mentira e nos ilude, tem que nos dar vida através de seu conhecimento.



Infelizmente vemos “verdades” sendo criadas dias após dia em nosso meio por “homens ímpios, que convertem em dissolução a graça de Deus, e negam a Deus, único dominador e Senhor nosso, Jesus Cristo.(Judas 1:4)”



Mas todos aqueles que têm o Espírito de Cristo dentro de si sabem que a verdade é imutável, permanece para sempre, que nossa opinião pouco ou nada vale a seu respeito, só nos restando anunciá-la aos quatro cantos do mundo. Independentemente de todas essas meias verdades que surgem dia após dia em nosso meio. “Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim. (João 14:6)”



Só nos resta escolher, ou o labirinto de nossos “achismos” filosóficos ou a estrada reta que conduz a perfeição.



“Não vos escrevi porque não soubésseis a verdade, mas porque a sabeis, e porque nenhuma mentira vem da verdade”. 1 João 2:2